Mercado de Câmbio - Cenário Macro

Esta semana começa sob a égide da última ata do FOMC do Fed e principalmente dos dados da inflação norte-americana. 

No entrando, tem-se visto poucos comentários sobre os dados da inflação brasileira que também saiu semana passada. 

No curtíssimo prazo, é verdade que nossa inflação pesa menos, mas para horizontes mais estendidos é útil uma análise comparativa já que disso depende a trajetória esperada da taxa de câmbio.

Antes, porém é prudente destacar que o teor da ata do FOMC foi mais generalista enfatizando por um lado a incerteza, a desinflação lenta e a piora do mercado imobiliário e por outro, no sentido positivo para o balanço de riscos, a desaceleração esperada da atividade em 2024. 

Esse último fator implica um sinal duplo para a taxa de câmbio já que se em um primeiro momento o enfraquecimento da atividade americana enseja uma redução do ímpeto contracionista dos juros de lá favorecendo o spread e detendo a depreciação cambial, por outro significa aumento do risco global que por sua vez leva à queda da demanda pelos ativos de risco, dentre eles o real, os títulos públicos e privados brasileiros e principalmente as ações daqui. Ou seja, força de depreciação cambial.

Olhando os dados de inflação CPI dos EUA vemos que no mês de março a inflação registrou 0,4%, de 0,4% em fevereiro e estimativa de 0,3%. No acumulado de 12 meses, o CPI ficou em 3,5%, de 3,2% em fevereiro e estimativa de 3,4%. 

Os núcleos fecharam o mês em 0,4% contra estimativa de 0,3% com o acumulado em 3,8% diante de estimativa de 3,7%. 

Há uma patente piora do quadro inflacionário já que mesmo a manutenção do panorama de fevereiro seria vista como ruim. 

Na prática, afasta-se a hipótese do ajuste sazonal que havia ganhado força no começo do inverno americano, já que os núcleos pioraram ligeiramente. 

A inflação de serviços de 3 meses anualizada bateu 7,8%. O quadro geral foi determinado principalmente pelos grupos moradia, seguros, saúde e energia (alta de 1,1% no mês).

A principal consequência dessa divulgação foi o aumento da probabilidade de corte de juros somente no segundo semestre pelo Fed, com alguns analistas considerando até o cenário de não haver cortes em 2024. 

Foi o terceiro aumento mensal seguido do CPI e com isso a maioria das projeções já recalcula como se dará o afrouxamento da política monetária com percepções de que haverá redução do montante total de corte e do número de cortes. 

Provavelmente apenas 2 de 25 bps somando 50 bps em 2024, no mais doce dos cenários projetados.

Logo após a divulgação dos dados a curva de juros subiu bem como o DXY e viu-se descontos nos índices futuros da bolsa americana e na brasileira que reagiu a uma curva DI bastante sensível que acompanhou a americana, sobretudo nos vencimentos de 10 anos. 

Na B3 saída de capital especulativo reagindo à alta das implícitas. 

O dólar chegou a 5,07 reais (alta de mais de 1%), na maior cotação à vista em 6 meses, em quadro agravado pelo rebaixamento da nota de crédito soberana da China pela Fitch Ratings de estável para negativa já que isso implica risco de desaceleração advinda do setor imobiliário chinês e uma queda do crescimento chinês afeta negativamente os termos de troca brasileiros. 

Esse movimento só foi suavizado pelas sucessivas altas do minério de ferro que mais que compensaram as quedas do preço do brent. Na 6°f a cotação spot bateu 5,15, outro recorde.

No IPCA brasileiro, em março o indicador apontou 0,16%, de 0,83% em fevereiro e expectativa de 0,25%. O acumulado ficou em 3,93%, de 4,5% em fevereiro e abaixo da expectativa de 4,01%. 

A substancial melhora quantitativa veio acompanhada de melhora qualitativa. Apesar de alta em 6 dos 9 grupos, a difusão foi de 55,59, menor que os 57,22 de fevereiro. 

A média dos núcleos ficou em 0,16%, de 0,49% em fevereiro, com o acumulado 12 meses em 3,8%, de 4% no mês anterior. 

A maior alta foi de 0,53% e impacto de 0,11 p.p. no grupo alimentação e bebidas, por conta do fator climático que afetou a oferta. 

Depois, saúde e cuidados pessoais com alta de 0,43% e impacto e 0,06 p.p., já transportes teve deflação de 0,33% com impacto de – 0,07 ponto percentual. Educação saiu de alta de 4,98% para alta de apenas 0,14% na esteira da saída dos dados dos gastos de reajuste das mensalidades escolares.

No entanto, a inflação de serviços chamou atenção negativamente. 

O indicador de serviços subjacentes subiu 0,45% no mês, de 0,44% no mês anterior. E em 12 meses ficou em 5%, de 4,9% em fevereiro. Pelo cálculo da inflação de serviços atualizada para 3 meses dessazonalizada o índice ficou estável a 5,7%.

No entanto, apesar do alerta advindo dos serviços, a avaliação do impacto para o mercado de câmbio deve ser analisada em perspectiva comparativa. 

A princípio, a inflação mais persistente nos EUA que no Brasil leva ao fechamento do spread de juros sendo uma pressão depreciativa para taxa de câmbio. 

Mas para fazer previsões deve-se olhar a taxa de câmbio real. 

Não necessariamente a previsão de longo prazo será igual à taxa de equilíbrio real que pode não se realizar no futuro, mas serve como direcional.

Isso porque por definição o câmbio real é dado pela taxa de câmbio nominal multiplicada pela relação nível de preços dos EUA e nível de preços do Brasil. 

Como a inflação é a variação do nível de preços e o câmbio real tende a se manter constante no longo prazo se aproximando do câmbio de equilíbrio, então fazendo a variação dos níveis de preços de EUA e Brasil teremos que, para manter o câmbio real constante, se a variação dos preços é maior nos EUA que no Brasil, então a taxa de câmbio nominal tem que ter variação menor que zero, ou seja, a taxa de câmbio nominal deve reduzir, logo apreciar.

É válido afirmar, portanto que no longo prazo há tendência de apreciação da taxa de câmbio brasileira em caso de manutenção da inflação americana mais persistente que a brasileira, mas que no curto prazo há tendência de depreciação por conta do ajustamento das taxas de juros diante das respectivas inflações, por meio da variação do spread de juros. 

Uma conclusão não invalida a outra e por isso é importante incluir a inflação brasileira na análise apesar do dado da inflação americana ter chamado mais atenção nos últimos dias.

E agora zé?

A partir dessa exposição é prudente depurar conjuntura de estrutura, com o componente conjuntural sendo mais relevante para quem está em posições que visam o curto prazo. 

Há uma tendência de subida da cotação do dólar futuro mais forte que a subida do à vista. 

A causa é a busca por hedge para posições em bolsa brasileira, sobretudo após o forte desconto causado pela crise da Petrobras. 

Esse movimento elevou as posições compradas dos agentes que se protegeram em dólar caso haja alta de juros que deprecie as ações da empresa. 

Outra causa foi a já esperada contraparte exercida pelos bancos no mercado à vista atendendo a demanda à vista atraída pelo cupom mais alto. 

Esse movimento deteve a depreciação à vista.

Já a consequência da alta futura maior que a spot é uma imediata abertura do dólar casado com queda do cupom cambial em movimento corretivo. 

Nesse caso, não seria necessária uma intervenção do banco central por meio de swap reverso e principalmente redução dos montantes de rolagem de swap tradicional. 

Outro fato novo no cenário é a maior aversão ao risco global pelos já citados movimentos de queda da demanda esperada na China e aquecimento do mercado americano. 

Assim, identifica-se demanda por dólar futuro originada nesse elemento de risco.

Finalmente, o fator fiscal se coloca como determinante no cenário doméstico já que o risco de revisão da meta de déficit primário é sólido e mesmo a nova meta pode não ser cumprida. 

A maior arrecadação em março é pontual já que foi devida ao efeito nível (impacto, não é um efeito de taxa) proveniente da taxação dos fundos exclusivos e offshores. 

Pelo lado dos gastos, a redução da inflação de 2023 para 2024 exige corte de gastos já que significa menor reajuste nominal do teto de gastos do arcabouço fiscal e isso também leva a uma futura correção para baixo da arrecadação nominal.

Nesse quadro conjuntural temos ainda uma depreciação do real de 3,34% no primeiro trimestre machucando posições compradas em real com o DXY subindo 3% no mesmo período. 

Com o câmbio acima de 5 reais, há hoje poucas chances de taxa na faixa de 4,70 e menos ainda em 4,50. 

O driver externo segue com o Fed cuja monta total de corte esperado de taxa saiu de 150 no começo de 2024 para 75 bps. 

Nesse sentido, só a desaceleração da economia americana pode criar margem para levar o real para 4,80 com algum prêmio configurando a faixa entre 4,80 e 4,90.

#B3

Nas contas externas, o minério de ferro chegou a altas de até 3,20% na semana passada o que afetou positivamente a B3 apesar de o petróleo ter furado o piso de 90 dólares por conta da tensão Israel x Irã. 

Para o investidor estrangeiro importa o risco PIB Brasil e a política de preços da Petrobras mais que a distribuição ou não de dividendos já que o primeiro afeta gravemente o balanço da companhia se alterado. As preocupações fiscais se concretizam quando os investidores notam que supondo taxa de crescimento do PIB de 2,5% o resultado primário deve ser de 1% ao longo de 3 anos. 

Essa percepção negativa que está por trás de dois elementos que impactam o mercado de câmbio: 1) a revisão das expectativas de inflação no FOCUS com leve piora, sobretudo avaliando a média dos economistas que ajustaram as projeções 5 dias antes (de 3,54% para 3,60% de inflação em 2025) e 2) a continuada saída de recursos da bolsa brasileira: só em 2024 houve saída de 23,58 bi de reais.

Outro exemplo da piora continuada da inflação esperada está nos DAPs, os futuros de cupom de IPCA que saíram de 3,87% na semana retrasada para 4,02% na semana passada para 2024 e de 4,83% para 4,97% nas mesmas comparações para 2025. 

Para 2025 ainda é esperada uma inflação corretiva fruto do represamento de preços públicos municipais em 2024, ano de eleições locais. Há ainda a inflação tarifária decorrente do repasse do varejo aos consumidores do reajuste do ICMS e das decisões fiscais do STF. 

Já os alimentos possuem em particular uma trajetória mais previsível já que no período inicial de plantio há maior remuneração do capital que leva a aumento da produtividade e da oferta. 

Num período seguinte há queda dessa produtividade e alta dos preços. 

Nesse sentido, a desinflação depende da China mais fraca e da redução da alta dos preços industriais, mas ambos os fatores debilitariam os termos de troca e depreciariam a taxa de câmbio em um primeiro momento. 

A expectativa de 2026 está condicionada a de 2025 pelo contágio e em breve será horizonte relevante do BC e também à inércia já que há reajustes de preços indexados na economia. 

Um choque de 0,50 p.p. em um trimestre implica um aumento de 0,35 p.p. nas projeções dos 6 trimestres seguintes. 

Daí temos a volatilidade do câmbio já que a alta da inflação aumenta o câmbio nominal que aumenta os juros que aprecia o câmbio nominal. 

O movimento de alta da taxa de câmbio acaba em um movimento de baixa.

Mas ainda falta um comentário sobre as questões estruturais que cada vez mais estão sendo usadas pelos analistas nos modelos de previsão cambial. 

Historicamente a taxa de câmbio brasileira é determinada pelo fluxo comercial e pelos investimentos externos diretos que mais que compensam o pagamento de serviços da dívida no exterior. Sendo o fluxo de portfólio mais especulativo. 

Porém, nota-se nos últimos 10 anos o aumento mais sustentado do fluxo comercial, que em termos de balanço de pagamentos significa redução da poupança externa sem depender de ajuste fiscal interno. 

Ou seja, não é preciso contrair a renda interna para que as importações fiquem abaixo das exportações, pois as exportações já estão acima. 

Com isso, começa a aumentar o investimento de brasileiros no exterior que implica saída de capitais do país em movimento que atua na depreciação cambial.

É isso que justifica o enfraquecimento da relação apreciação cambial x alta de preços de commodities. 

O investimento de brasileiros no exterior neutraliza parte do efeito de entrada de fluxo comercial e torna maior a dependência da formação da taxa de câmbio aos investimentos de estrangeiros no Brasil (frágil pelo baixo crescimento esperado) e ao capital especulativo (volátil hoje por conta da alta da aversão ao risco global).

Um exemplo numérico está no volume de investimentos de residentes no exterior em 12 meses que hoje soma 10 bilhões de dólares. 

O investimento em portfólio no exterior é de 6 bi. 

As remessas de lucros e dividendos referentes aos investimentos estrangeiros no Brasil somam 75 bi de dólares por ano em média. Mas o investimento externo no Brasil saiu de 60 bi em 2011 para 33,7 bi hoje no acumulado 12 meses. 

O spread de juros reais é de 4% (6% Brasil menos 2% EUA) o que parece ser um piso indicando pouca margem para depreciação no longo prazo.

Isso porque o câmbio real é uma função da inflação e do prêmio de risco que depende de elementos político-institucionais e hoje seguem altos no câmbio e na curva de juros. 

Já o câmbio de equilíbrio parece mais distante de ser alcançado e depende dos termos de troca, do câmbio real e da produtividade do trabalho e ronda entre 4,50 e 4,70 reais.


Grande abraço,

Postagem Anterior Próxima Postagem


نموذج الاتصال